Infecção como efeito adverso de anti-inflamatórios

Os artigos aqui revisados são antigos, e a literatura é escassa, mas o assunto é extremamente importante.

  • Anti-inflamatórios não esteroidais (AINES) são usados em larga escala, tanto através de prescrição médica quanto como por automedicação. Esta classe de medicamentos é vendida livremente, em prateleiras de farmácias (OTC ou over the counter). Seus benefícios são inquestionáveis, 19-diet-pillsassim como seus efeitos adversos.
  • Muitos dos efeitos colaterais são conhecidos, como os problemas relacionados à agregação plaquetária (De forma diferente, os COX não seletivos e os COX-2 seletivos), sobre estômago e rins.

Vamos nos lembrar que os AINES agem numa fase crítica da resposta imune, o sistema inato, mais inespecífico, mas crucial para eliminação rápida de agressores: a cascata do ácido aracdônico.

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Este processo é disparado no momento em que há lesão de membranas celulares, com exposição de fosfolipídeos. Dentre os caminhos seguidos pela degradação de fosfolipídeos, chegamos às cicloxigenases, levando à produção de prostaglandinas e tromboxanos. Estas substâncias estão ligadas à agregação plaquetária e principalmente promovem migração de neutrófilos e macrófogos, e a fagocitose. Ou seja, são substâncias importantes no estabelecimento de inflamação, eliminação de patógenos e reconsituição de  tecidos lesados.

Sendo assim, de alguma forma não deveriam promover alguma forma de imunodepressão?

Avaliação através de sistema de notificação de eventos adversos

Em geral, os AINES são seguros do ponto de vista imunológico, o que pode ser comprovado pelos poucos relatos de problemas em milhões (ou bilhões) de prescrições.

No entanto, na vigência de infecções bacterianas, é possível que o uso de AINES possa reduzir a resposta a estes agentes – não se sabe se a todos ou se a alguns em específico.

Este é um dos poucos estudos que tenta mostrar o risco de desenvolvimento de infecções graves (necrosantes) de pele e partes moles, e pacientes com outros diagnósticos. Eles selecionaram casos reportados através de vigilância e realizaram caso-controle com 228 pacientes sem infecções de pele complicadas. A metodologia é restrita (seleção enviezada de casos, escolha de controles pouco apropriada), mas os resultados levantam a suspeita que muitas vezes percebemos na clínica e lemos em relatos de casos publicados.

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A maior ocorrência de infecções virais no grupo de casos provavelmente é variável de confusão.

C. Souyri, P. Olivier, S. Grolleau, M. Lapeyre-Mestre e oFrench Network of Pharmacovigilance Centres – Severe necrotizing soft-tissue infections and nonsteroidal anti-inflammatory drugs. Clinical and Experimental Dermatology, 2008; 33, 249–255.

Varicela-Zoster

Em 2007 outra publicação mostrou aumento no risco de infecções de pele e partes moles em pacientes com varicela zoster. Cabe lembrar que esta infecção viral é porta de entrada para bactérias.

Neste estudo, eles identificaram 140.111 pacientes com diagnóstico de varicela (sistema de notificação informatizado).  Os autores identificaram pacientes que apresentaram infecções complicadas de pele e partes moles até 30 dias após o diagnóstico de varicela e parearam com pacientes que não desenvolveram a infecção complicante. Os resultados também mostram risco associado aos AINES. Desta vez, num estudo com melhores definições e pareamento, a dimensão  do risco é menos assustadora, mas ainda existe.

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Yann Mikaeloff, Abbas Kezouh & Samy Suissa – Nonsteroidal anti-inflammatory drug use and the risk of severe skin and soft tissue complications in patients with varicella or zoster disease. Br J Clin Pharmacol 2007;65(2): 203–209.

Infecções estreptocócicas

Os artigos anteriores abordaram uso geral de AINES. E o uso em pacientes que apresentam infecções bacterianas, a evolução seria pior? Diversos relatos de casos descrevem possível associação entre AINES e infecções necrosantes de pele e partes moles. Dentre estas, as infecções necrosantes causadas por estreptocos do grupo A são bastante graves.

Este estudo experimental mostra que o uso de AINES em camundongos (comparando antibiótico isoladamente versus antibiótico + AINES) leva a maior mortalidade e menor eficácia do antimicrobiano. Ou seja, a maior cautela seria exatamente no paciente que apresenta uma infecção bacteriana aguda. Provavelmente.

Stephanie M. Hamilton, Clifford R. Bayer e mais – Effects of Selective and Nonselective
Nonsteroidal Anti-inflammatory Drugs on Antibiotic Efficacy of Experimental Group A
Streptococcal Myonecrosis.The Journal of Infectious Diseases 2014;209:1429–35

Mesmo que não tenhamos conclusões definitivas, possuímos evidências que não podem ser desprezadas. A sugestão é realizar uso judicioso (sob prescrição médica), pesando riscos e benefícios. É necessário um estudo de grande porte sobre o assunto. 

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Um pensamento sobre “Infecção como efeito adverso de anti-inflamatórios

  1. […] Previamente já discutimos risco de infecções graves e uso de anti-inflamatórios não esteroidais […]

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