Artigo: Fluoroquinolones and collagen associated severe adverse events: a longitudinal cohort study
Autores: Nick Daneman, Hong Lu, Donald A Redelmeier
Local: Toronto, Ontario, Canada
Fonte: BMJ Open 2015;5:e010077
Estudo: Os dados do estudo foram obtidos por banco de dados informatizado, compreendendo a população de Ontario. Trata-se de coorte com pacientes que completaram 65 anos entre 1997 e 2012. Os desfechos estudados foram as doenças relacionadas ao colágeno, grave, diagnosticadas em serviço de emergência: ruptura de tendão,aneurisma de aorta e dissecção, e descolamento de retina. Foram analisados diversos fatores de risco, inclusive uso de quinolonas (qual droga, dose, número de cursos, intervalo entre uso e evento,e janela de trinta dias sem uso de quinolonas).
Resultados:1 744 360 pacientes completaram 65 anos de idade durante o estudo. Ruptura de tendões ocorreu em 37 338 pacientes (2.1%), descolamento de retina em 3246 pacientes (0.2%) e aneurismas de aorta em 18 391 pacientes (1.1%). Os aneurismas de aorta foram particularmente importantes uma vez que 12 583 (68%) foram codificados como diagnóstico primário – sem registro anterior -, 9717 (53%) foram admissões de urgência, e 3126 (17%) resultaram em ruptura ou dissecção após o diagnóstico primário. Como pode ser visto na tabela, a hazard ratio (HR) demonstrou associação mais forte do uso de quinolonas com tendinopatia (HR 3.13, IC 95% 2.98 a 3.28), e aneurisma de aorta (HR 2.72, IC 95% 2.53 a 2.93). O descolamento de retina, menos associado, só se mostrou significante na análise multivariada.

A associação foi mais marcante com o uso próximo da quinolona, sendo que o intervalo entre o uso e o desenvolvimento de doença foi próximo de 20 dias.
Utilizando pacientes com uso prévio de amoxicilina como rastreador negativo, mostrou-se fraca associação da amoxicilina, provavelmente relacionado às comorbidades (variável de confusão), reforçando a especificidade das quinolonas no desenvolvimento de doença do colágeno. A associação com aneurisma de aorta, achado mais preocupante do estudo, foi demonstrada independente da presença ou ausência dos principais fatores de risco avaliados.

Comentários: Quando um infectologista promove um programa de uso racional de antimicrobianos seu objetivo não é limitar a atuação de qualquer profissional e muito menos estabelecer uma discussão de poder. Os médicos têm autonomia de prescrição e esta deve ser preservada. Mas a segurança de pacientes e a melhor conduta clínica são a prioridade, pois o foco da medicina é o paciente. No caso da antibioticoterapia, o uso não racional tem consequências para a comunidade bastante relevantes (resistência), diferente de outras classes medicamentosas, o que justifica a intervenção do infectologista, respeitando-se o direito à autonomia e os ditâmes éticos.
Ainda assim é importante discutir as consequências do uso não racional de antimicrobianos para o próprio paciente.Até porque o conhecimento de antibioticoterapia é tido como “difícil” por muitos médicos, o que leva à preferência pelo uso de antimicrobianos de amplo espectro para geração de segurança para o profissional. Vemos hoje a prescrição de piperacilina-tazobactam ou quinolonas para pacientes que não se beneficiam destas drogas, sem a preocupação com efeitos colaterais, que muitas vezes nem são imaginados. Em geral, associa-se o uso de antimicrobianos somente com a insuficiência renal (aminoglicosídeos) ou alergias (penicilina. Mas antimicrobianos podem levar a inúmeros eventos adversos, podendo ser lembrados mais rapidamente as diarreias, neurotoxicidade (muito importante e potencialmente letal em idosos), hepatopatias, arritmias (quinolonas) e artropatias (quinolonas).
A associação entre artropatias e quinolonas é antiga. Esta é a principal razão pela não liberação de seu uso em pediatria. No entanto, o problema não se limita ao fechamento da placa epifisária em crianças. Artralgia e artrite são frequentes. Tendinopatias e ruptura de tendões são descritas. O FDA tem alerta específico para quinolonas, com relação a tendinopatias e exacerbação de miastenia gravis.
Hoje admite-se que há uma doença de colágeno associada às quinolonas, que não impede seu uso, mas que requer alerta para manejo. O que mais chama a atenção é o aumento na incidência da ruptura de aneurismas de aorta.
A tendinopatia está relacionada a problemas com o colágeno dos tipos I e II. Em teoria, tanto o aneurisma de aorta como o descolamento de retina podem ser desencadeados pelos mesmos problemas de colágeno.
Os resultados são preocupantes. É possível que casos de ruptura de tendão, de aneurismas de aorta ou de descolamento de retina estejam acontecendo sem que pensemos na associação com os antimicrobianos.
Este é um terreno novo, e não justifica qualquer intervenção mais restritivas, mas é importante que se faça:
1. Tentar estabelecer na rotina relação entre uso de quinolonas e doença de colágeno já diagnosticada.
2. Educação quanto aos riscos.
3. Identificação de pacientes em riscos.
4. Estratégias de vigilância.
5. Identificação de pacientes com fatores de risco para desenvolvimento deste efeito adverso. Provavelmente devemos pensar naqueles com doença já existente ou com importantes previamente conhecidos.
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