Três pontos sobre a vacina da dengue

Após anos de espera, chega uma vacina para dengue. Para melhor compreendê-la, algunas tópicos são importantes para discussão.

 

 

Quatro sorotipos e diversidade: uma vacina?

Os flavivírus em geral são vírus estáveis do ponto de vista genético. Dentre eles, o vírus da dengue é o que mais apresenta variabilidade. Há uma divergência de aproximadamente 40% entre as sequências de aminoácidos dentre os sorotipo, e cerca de 9% de mismatch dentre cada um dos sorotipos. Esta variabilidade prejudicaria o desempenho da vacina?

Uma parte da compreensão (ainda incompleta) deste assunto está na identificação da resposta induzida pela vacina, em particular daquela feitas a partir de vírus vivos atenuados. Existe uma resposta de anticorpos após imunização, em maior quantidade contra prM e NS1, mas estes anticorpos são não neutralizantes.  Há também estímulo à produção de anticorpos contra a proteína E, estes, sim, neutralizantes. O curioso é que, em ensaios clínicos, percebe-se alguma dissociação entre a produção de anticorpos e a proteção cínica e a soroconversão.  O papel da células T no desenvolvimento de defesa contra a dengue parece ser relvante do que se achavas no passado.

Jacky Flipse, Jolanda M. Smit – The Complexity of a Dengue Vaccine: A Review of the Human Antibody Response. PLoS Negl Trop Dis 9(6): e0003749.

Imunogenicidade: a vacina confere proteção?

Os estudos mostram que as vacinas – e aqui focamos na  vacina de vírus vivos atenuados, com doses em 0,6 e 12 meses -, são imunogênicas e há tanto soroconversão quanto proteção clínica. A soroconversão variou com idade, número de doses (melhor com três) e com o sorotipo. O sorotipo 2 foi associado com menor proteção.

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Jelitha Ramachanderam,  Nirmalatiban Parthiban e mais – Descriptive Review of Safety, Reactogenicity and Immunogenicity of Dengue Vaccine Clinical Trials, 2003 –
2013.Med J Malaysia Vol 70 No 2 April 2015: 67.

 

A vacina poderia aumentar a incidência de casos graves

 

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Extraído de : Sarah George – Prospects for a Dengue Vaccine: Progress and Pitfalls. Missouri Medicine 2014; 111(3): 337.

 

Esta é a questão mais interessante. Como vemos na figura, o segundo episódio de dengue, com sorotipo distinto, é o que mais apresenta risco de manifestações graves. Existem diversas hipóteses, a mais prevalente hoje é a da exacerbação dependente de anticorpos (ADE). Nesta hipóteses, postula-se que os anticorpos produzidos contra um sorotipo do vírus possuem ação sobre os demais sorotipos, mas uma ação não-neutralizante. Uma vez promovendo a fagocitose de vírus não neutralizados, estes anticorpos promoveriam uma amplificação da infecção viral e o risco 20 a 80 vezes maior de desenvolvimento de dengue grave.

Uma vacina tetravalente capaz de produzir anticorpos neutralizantes contra os quatro sorotipos em teoria eliminaria os riscos. Os ensaios clínicos com a vacina tetravalente confirma estes achados: proteção menor para adoecimento, proteção maior contra as formas graves.

Estudos Fase III na Ásia e América do Sul mostram proteção contra a dengue de 51.1%–79% e 31.3%–77.5%, respectivamente. Já a incidência de dengue grave foi reduzida em 80%–90% e hospitalização em 67%–80%.

Jacky Flipse, Jolanda M. Smit – The Complexity of a Dengue Vaccine: A Review of the Human Antibody Response. PLoS Negl Trop Dis 9(6): e0003749.

 

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